terça-feira, 30 de outubro de 2007

The Killers

Sempre que uma situação começa a ficar boa ou simplesmente começa, solto minhas frasezinhas bombas. Não sei se com isso quero realmente foder a minha vida ou me proteger de me foder. Acho que segundos antes de explodir tudo, penso assim: se eu falar a frase mais errada do mundo, só os realmente fortes sobreviverão. O que eu não percebo é que no começo de alguma coisa, ninguém ainda é realmente forte para agüentar minhas frasezinhas bombas. E todo mundo, sem exceção, acaba correndo assustado. E no dia seguinte eu acordo com aquele misto de vitória com tristeza. Sozinha novamente. Como se isso fosse um prêmio mas também uma doença. Dentre as minhas frasezinhas bombas tenho três prediletas “to morrendo de saudades de você”, “a vida sem amor é uma merda” e “você me dá pouca atenção”. Quase nunca to morrendo de saudades de alguém, não existe a menor chance de eu amar algum desses trastes que me aparecem e caguei se eles me dão ou não muita atenção. Mas ainda assim falo, ainda assim mando uma frase dessas. Só pra ter o triste prazer de ver o covarde ficando branco, escondendo os dentes, enfiando o pinto no cu. E sumindo finalmente da minha vida. É o jeito que arrumei de me rebelar contra essa hipocrisia masculina. Eles podem dormir na casa da gente, enfiar o pauzinho no meio das pernas da gente, pedir uma torradinha com requeijão de manhã, mijar pra fora do nosso vaso, contar a vida deles e pedir mais carinho nas costas. Mas não suportam ouvir no dia seguinte um simples “gosto de você”. Covardes de merda. Odeio essa hipocrisia masculina. Se eles falam mil vezes que querem te ver é tesão e você não pode se assustar, mas se você falar uma única vez que quer vê-los, é porque você é uma mala que está “misturando sentimentos”. E eles podem se assustar. Que preguiça desse planetinha dos macacos e suas bananas. E sigo com minhas frases matadoras. “Pensei em você hoje”; “Voltei antes pra te ver”; “Vamos nos ver hoje?”; “Vamos comigo na festa da minha amiga?”; “O que você vai fazer no feriado?” E tenho cada dia mais nojo de como frases ditas pra ser agradável soam como um assassinato. E tenho nojo de pensar que quando você tira o controle deles, eles não sabem mais o que fazer com você. “O que eu vou fazer com uma mulher que eu já conquistei?” Que tal continuar conquistando todos os dias, seu idiota? Que tal viver uma história que passe da primeira página? Tenho cada dia mais nojo de como as pessoas se consomem e não se conhecem, não vivem nada. Não sabem nada da vida da outra a não ser o tamanho dos peitos e se o desenho dos pêlos é mais para Claudia Ohana ou bigodinho do Hitler. Sempre lembro de uma vez que fui passar cinco dias com um namorado no alto de uma montanha e ele me apareceu com um verdadeiro “kit putaria”. Passou antes no sex shop e comprou de óleo de massagem a roupinha de enfermeira. Tenho certeza que fez isso porque pensou “que porra vou fazer com uma mulher cinco dias em cima de uma montanha a não se trepar”? Se fosse algum dos seus amiguinhos eles poderiam rir, se divertir, beber, conversar, apostar corrida, jogar videogame, brincar na piscina, fazer trilha. Mas com uma mulher? Um ser estranho chamado mulher? Que porra ele iria fazer não é mesmo? Homens acham que a página 1 é trepar e a página 2 é casar. E como têm pavor da 2 (e quem disse que as mulheres também não têm?) acabam nunca saindo da 1. E nisso conversas incríveis, descobertas maravilhosas e histórias lindas morrem antes mesmo de nascer. Eles podem te comer mas jamais passear de mãos dadas com você. Isso tudo me dá um bode profundo. Mas no fundo tenho mais bode é de mim. Por ter dito frases desse tipo para pessoas sem nenhuma magia, sem nenhuma poesia. E que ao invés de enxergar beleza enxergaram “carne ganha”. E no fundo eu nem sentia nada por essas pessoas, estava apenas testando a hipocrisia do mundo. Estava apenas comprovando que se tratava apenas de mais uma “carne podre”. Acho de verdade que a puta da Glenn Close estragou a vida de algumas mulheres. Basta você dizer um inocente “você é legal” pro cara achar que você vai se mudar pra casa dele, mergulhar o poodle dele numa panela fervendo e parir trigêmeos bem no dia do futebol com os amigos. Da onde eles tiram que somos tão assustadoras? A gente só quer ter com quem rir no final do dia e ganhar alguns beijos no lugar certo. Nada muito diferente do que eles querem. Mas cansei. Definitivamente cansei. Cansei de um mero “nossa, tava pensando em você” equivaler a um “nossa, tava pensando em você de terno e gravata no altar de uma igreja”. Já que pouca coisa assusta tanto, decidi que agora vou jogar pesado. Daqui pra frente minhas frases matadoras vão ser de “quero ter um filho seu” pra pior. Quem quiser sair comigo vai ter de ouvir “posso dormir aqui?” ou ainda “acho que posso me apaixonar por você”. E quem sobreviver a esse verdadeiro extermínio de pretendentes, vai descobrir que eu sou só mais um ser que morre de medo do amor e da convivência. Vai descobrir que falo as frases erradas justamente pra espantar as pessoas e não ter mais trabalho. Mas de verdade (e dessa vez sem medo de assustar ninguém) adoraria encontrar alguém que resolvesse correr esse risco junto comigo.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Barraqueiros corações

Sim, homem é frouxo, só usa vírgula, no máximo um ponto e virgula; jamais um ponto final.
Sim, o amor acaba, como sentenciou a mais bela das crônicas de Paulo Mendes Campos: “Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar...”
Acaba, mas só as mulheres têm a coragem de pingar o ponto da caneta-tinteiro do amor. E pronto. Às vezes com três exclamações, como nas manchetes sangrentas de antigamente.
Sem reticências...
Mesmo, em algumas ocasiões, contra a vontade. Sábias, sabem que não faz sentido prorrogação, os pênaltis, deixar o destino decidir na morte súbita.
O homem até cria motivos a mais para que a mulher diga basta, chega, é o fim!!!
O macho pode até sair para comprar cigarro na esquina e nunca mais voltar. E sair por ai dando baforadas aflitas no king-size do abandono, no Continental sem filtro da covardia e do desamor.
Mulher se acaba, mas diz na lata, sem metáforas.
Melhor mesmo para os dois lados, é que haja o maior barraco. Um quebra-quebra miserável, celular contra a parede, controle remoto no teto, óculos na maré, acusações mútuas, o diabo-a-quatro.
O amor, se é amor, não se acaba de forma civilizada.
Nem no Crato...nem na Suécia.
Se ama de verdade, nem o mais frio dos esquimós consegue escrever o “the end” sem uma quebradeira monstruosa.
Fim de amor sem baixarias é o atestado, com reconhecimento de firma e carimbo do cartório, de que o amor ali não mais estava.
O mais frio, o mais “cool” dos ingleses estrebucha e fura o disco dos Smiths, I Am Human, sim, demasiadamente humano esse barraco sem fim.
O que não pode é sair por ai assobiando, camisa aberta, relax, chutando as tampinhas da indiferença para dentro dos bueiros das calçadas e do tempo.
O fim do amor exige uma viuvez, um luto, não pode simplesmente pular o muro do reino da Carençolândia para exilar-se, com mala e cuia, com a primeira criatura ou com o primeiro traste que aparece pela frente.
E vamos ficando por aqui, pois já derrapei na curva da auto-ajuda como uma Kombi velha na Serra do Mar... e já já descambarei, eu me conheço, para o mundo picareta de Paulo Coelho. Vade retro.

De Xico Sá.

Pôr-do-sol.

De Tati Bernardi.

Ela está prestes a perder a graça. Mas ainda tem algumas horas. As melhores horas da sua vida. O banho que antecede o sexo é o melhor do mundo. Ela jamais perde tempo se sentindo por dentro, se valorizando tanto, como quando se prepara para alguém. Tem até aquele esfoliante de erva cidreira que ela só usa quando está se preparando para alguém.Escolher a roupa é o inverso de vestir um defunto. É como se fosse a última roupa do mundo, mas nesse caso para celebrar a vida. Uma roupa para sempre.Escovar os dentes também é uma tarefa mais cuidadosa quando se vai doar o gosto da vida para alguém. Ela escova a língua, bem funda, e não sente ânsia de vômito. Sente ânsia, mas é diferente. Uma explosão eminente que não vai explodir. O coração pode estourar, o estômago pode estourar, a cabeça pode estourar, mas não estoura. Ela inteira é uma festa de fogos de artifício que não acontece. Mas os olhos brilham o segundo antes de acontecer.Quando ela pega o elevador, é como se dissesse para cada um dos moradores do seu prédio familiar. É como se batesse na porta deles e dissesse que enquanto eles comem carne requentada com arroz sem graça. Que enquanto eles comentam que o Jornal Nacional ta um saco. Que enquanto eles atendem o telefone forçando uma simpatia aguda que soa como uma sirene de desespero. Ela vai dar. Ela vai dar. Ela vai dar. Ela vai provocar em alguém um mistério que para ela é a única coisa que importa no mundo e para eles mais alguma coisa sem importância. Apesar do mundo inteiro dizer que são os homens que dão mais importância para isso. O rádio nesses dias sempre colabora. Sempre toca músicas boas e aquele CD que andava sumido sempre aparece depois de alguma brecada. Aos pés da ocasião. Tudo está aos pés da ocasião. E o espelhinho então revela a mulher que ela é de verdade. Não aquela com preguiça de se pentear e com a sobrancelha por fazer. Mas a mulher que ela é. Ela nasceu maquiada, com esses olhos cheios de brilho e de vida, e essa boca querendo engolir o mundo, digerir o mundo, sentir o mundo, chupar o mundo. Nesses dias até sua coluna fica ereta. Músculos nascem, celulites morrem, cinturas afinam. Seu cheiro natural são todos esses artifícios que ela misturou para o grande momento. A mentira toda é a única verdade que existe.Sua rua não é apenas a rua que desemboca na rua que desemboca na avenida. Tudo é sedutor. Virar uma esquina, furar o farol, dar uma seta. Tudo compõe uma trilha de sexo. Tudo leva ao sexo. Ela vai dar. Ela vai dar. E a cidade até que é bonita com esses motoqueiros tirando finas. A cidade pulsa. E os bancos de couro ensebado dos táxis e as peruas Kombi. Tudo pulsa. Ela não tem nojo de nada. O halls preto purifica tudo, transforma o mundo em um lugar até que interessante e prepara seu hálito para o único momento que realmente importa nesses dias chatos. O momento em que ela vai arrancar tudo o que a protege de mergulhar em si mesma. Ela vai mais uma vez amar sozinha, mas tudo bem. Todos os outros dias que chegam para curar esse momento, nada mais são que a espera e a preparação para outro machucado. É como se ela fosse um ponto de interrogação incompleto. E precisasse daquele furo que vai ao final do ponto de interrogação. O pingo final de uma dúvida que começa nela e não termina em lugar nenhum. Para ela então poder ser inteira uma dúvida. Tão inteira que completa. E sentir o mistério da vida. E não entender nada mas estar no mundo. Ser mundana. E voar. E tudo isso de tão absurdo e maluco, vazio. E a dor do vazio. E tudo isso que vem depois. Mas ainda não é a hora. Por enquanto ainda tem graça dizer coisas malucas e forçadas e verdadeiras ao estilo “hoje acordei assim”. Por enquanto tem graça renegar um abraço ou abraçar com desespero. Por enquanto tem graça molhar o lábio inferior e prolongar ao máximo os segundos.E ela jura que todos que estão parados no trânsito sabem como ela cheira bem. Ela jura que todos sabem o quanto ela está limpa porque não existe limpeza maior do que os minutos que antecedem sujeira. Ela jura que vai transar com o mundo e o mundo vai transar com ela. Rússia, Holanda, Japão, todos sabem onde ela está indo. E todos vão com ela. Não existe poucos amigos, não existe “pequenices” de alma, não existe chorinhos baixos. O que existe é um mundo que pulsa no meio de suas pernas e o meio das suas pernas pulsando no mundo. É o minuto da alegria mais plena e da solidão mais povoada. Ela vai dar. Ela vai dar.O porteiro poderia morrer por ela. A mulher no elevador poderia mata-la. Ela é causadora de grandes catástrofes mas também poderia salvar o mundo.Quando ele abre a porta, seu coração se parte em dois. Ela sabe que se trata do ser mais amado do universo. Mas sabe que também se trata de mais um ratinho de laboratório que tem vida e importância curtas. Ela vai precisar ama-lo desesperadamente para conseguir se abrir. Mas ela sabe que isso é apenas uma droga barata e não proibida que ela toma para sentir a vida e poder comer a si mesma. E depois vomitar a si mesma. E resgatar seus pedaços azedos como um porco faminto. Ela sabe que tudo só acontece dentro dela.Ela está prestes a perder a graça. Mas ainda faltam alguns minutos. Os melhores minutos da sua vida. Naquele minuto que antecede uma coisa tão banal quanto encaixar duas pecinhas de lego para formar uma ponte, ela é a única mulher do mundo. E se ela disser que quer morrer, comer um abacaxi ou escutar o som de um dedão do pé estalando. Ela será a única mulher do mundo. A melhor do mundo. E então a vida, maravilhosa como é, diz baixinho no ouvido dela: ir embora agora, sendo a única mulher do mundo, mas não trepar com esse cara. Ou trepar com esse cara e ser apenas mais uma mulher do mundo. E então, apenas porque também precisamos da banalidade para não explodir com a vida, ela abre as pernas e perde totalmente a conexão com a Rússia, a Holanda e o Japão.E as ruas são apenas ruas. E os motoboys, e as peruas Kombi, e os taxistas. E os faróis infinitos. E tudo leva a um caminho longo de queda sem almofadas. E o espelhinho revela uma mulher que precisa de banho e demaquilante. O CD some novamente e o rádio toca mais uma modinha idiota. E ela é só mais uma. Mas pelo menos ela deu. Ela deu. Ela deu.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

SAUDADES DA PORRA!!!
Gerúndio
Sei tão pouco de você. Qual seu prato preferido, pizza, churrasco, salada? Será que come milho? Não sei se gosta de voar, se já esquiou na neve, se anda bem em pedra, não foge de água funda. Se prefere Chico a Caetano, gato a cachorro, inverno a verão. Se é analógico ou digital, tecnológico ou simples. Não conheço seus pais, irmãos, não tenho idéia se é melhor em pingue-pongue ou pebolim; em vôlei ou basquete. Não sei se caminha, se conhece Praga, Japão, Havaí, qual a viagem mais sensacional que já fez. Se é homem do mar, do mato, urbano.
Sei, sim, que gesticula sem parar quando fala. Nessas horas acompanho, hipnotizada, suas mãos no ar.
Será que gosta de surfar ou prefere mergulhar? Ou troca os dois por uma cerveja gelada na sombra de uma amendoeira? Aliás, gosta de uísque? Cidra? Tequila, será? Ou apenas água? Não conheço seus medos. Não sei dos tombos que levou, pouco posso inferir sobre sua cor preferida. Azul? Laranja? Preto? Não sei se gosta de dormir de bruços, encolhido. E de manhã, torrada ou pãozinho? Fruta ou iogurte? Ou tudo junto e mais ovo mexido e café preto? Não sei a marca do seu creme dental, quantas vezes faz a barba por semana, se usa protetor solar como sua dermatologista gostaria.
Sei, sim, que franze a testa e em seguida sorri só com os lábios quando fica curioso.
Será que samba bem? Teria paciência para ensinar-me? Costuma chorar? Por qual motivo? Novela, música, pela perda de alguém querido, ao cair de mal jeito em uma partida de futebol? Ou será que segura tudo e dissolve com remédio para úlcera depois? Sentava nas cadeiras da frente ou nas de trás na escola? Tirava notas altas? Já combinava tão bem bom humor e seriedade naquela época? Será que lê mexendo os lábios? Toca violão, decorou o hino nacional inteiro, sabe declamar I-Juca Pirama "Sou bravo / sou forte / Sou filho do Norte"? Sei lá.
Sei que meu rosto vibra quando imagina as pontas dos seus dedos se aproximando.
Nada sei de antigas namoradas, quem o feriu, se você aprontou, se fugiu, foi bobo, criança. Se vê televisão no domingo à noite. Quais são seus piores defeitos? Seus vícios? Acho que isso não quero saber não. É teimoso, estabanado, egoísta? Crê ou duvida? Será que percebe ironias, inseguranças? Desconfio que você consegue me ver, mesmo com os meus habituais disfarces ativados.
Mas não sei e não perguntarei. Quero descobri-lo aos poucos, como se você fosse um livro intrigante que me tenta a uma leitura rápida, porém que vale uma cuidadosa pesquisa para que possamos desfrutar melhor cada capítulo, folha, linha, palavra, espaço.
Conheço seu olhar um segundo antes de me beijar. E gosto. Por hora, isso basta.